Um educador musical que apresenta caminhos didáticos para explorar elementos musicais presentes em um texto é o inglês John Paynter. Em seu livro Hear and Now (1972), no capítulo Colourful sounds around us o compositor traz a seguinte proposta de atividade:
“Individualmente, cada um da classe deve escolher qualquer parágrafo de um texto qualquer (aproximadamente um minuto de leitura) – jornal, livro, um poema, um problema de matemática, etc., ou escrever seus próprios textos.
A classe deve ler alto e simultaneamente seus textos de maneira normal.
As propriedades básicas agora devem ser aplicadas da seguinte forma:
Duração: Séries de diferentes durações, de um segundo até um minuto, podem ser livremente escolhidas para demonstrar isso. O começo e o fim devem ser indicados por gestos apropriados de regência.
Velocidade/Articulação: Essas podem variar da mais rápida maneira de ler até a mais lenta pronúncia de cada palavra.
Volume/Intensidade: Esse pode variar entre o quase inaudível sussurro e o grito.
Altura: Essa pode variar entre a mais aguda e mais grave notas da extensão vocal e pode, em um estágio posterior, ser associada mais especificamente com as vozes masculinas e femininas, respectivamente”
(Paynter, Hear and Now, 1972)
Com esse jogo de leituras variadas o professor e os alunos exploram diversos elementos musicais, podendo surgir muitas outras maneiras de abordar as propriedades sonoras.
Experimente colocar o silêncio nessa leitura musical. Peça aos alunos para que façam a divisão silábica das palavras e leiam apenas a primeira sílaba de cada palavra, sustentando, em silêncio, a duração das demais sílabas. Dessa maneira a leitura se torna segmentada e a dimensão do silêncio é inserida. Isso também pode ser feito lendo apenas as palavras monossílabas. O efeito será semelhante.
Que tal ler apenas as palavras que tenham letras explosivas como B, C, D, P e T, criando qualidades de timbre para seu texto? Ou usar as palavras que contenham os nasais M, N e NH? O raspado R? O sibilante S, SS e Ç.
Você pode pedir aos alunos que criem padrões rítmicos para a leitura do texto. Para isso, basta variar a velocidade da pronúncia das sílabas das palavras; ora mais curtas, ora mais longas.
Vários exemplos das estruturas apresentadas anteriormente neste texto estão presentes no repertório de músicos e compositores brasileiros.
CURIOSIDADE!
Hermeto Pascoal, músico, compositor e multi-instrumentista alagoano, por exemplo, criou um termo chamado som da aura e o explica:
“Aos 7 anos de idade descobri que a nossa fala é o nosso canto. O mais natural de todos, pois cada fala é uma melodia. Eu costumava dizer para minha mãe que ela e suas amigas estavam cantando quando conversavam, mas ela dizia: _Deixe disso, menino! Você está ficando louco?” (Disponível em: http://www.hermetopascoal.com.br/musicas.asp).
Em seu álbum, Festa dos Deuses, Hermeto traz um exemplo dessa música construída por meio da fala, musicando o poema Três coisas, recitado por Mário Lago.
Ouça a música “Três Coisas – Hermeto Pascoal & Grupo” do CD Festa dos Deuses
Tiago Teixeira Ferreira é educador musical, pesquisador, clarinetista e regente. Licenciado em Educação Musical e Mestre em Música, dedica-se à pesquisa de práticas criativas em Educação Musical e como elas podem auxiliar nos processos de aquisição da linguagem da música. Ainda, pesquisa a respeito de processos de aprendizagem musical em propostas coletivas de ensino de música. É integrante do G-PEM (Grupo de Pesquisa em Educação Musical), atua como clarinetista em uma Banda de Música Militar, é membro do Seminário Permanente de Regência MUSICAD, além de coordenador pedagógico, professor e regente em projetos sociais de ensino de música.
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Tiago Teixeira Ferreirahttps://criativamusica.com/author/tiagoteixeira/
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